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Quando o simples descomplica: comportamento do consumidor, havaianas e outras reflexões

Se olharmos bem para o consumo contemporâneo, veremos dois fenômenos aparentemente opostos que ganham força, e que vale observar de perto: por um lado, a ascensão de produtos que celebram simplicidade, conforto e familiaridade; por outro, o retorno de experiências mais offline, táteis, literais, que resistem à ubiquidade digital.

Neste contexto, o caso da Havaianas e o panorama das tendências de comportamento da WGSN oferecem bons mapas para refletir sobre o que move o consumidor de hoje e o de amanhã.

O caso Havaianas: um chinelo que é mais do que um chinelo

Recentemente, a Havaianas foi apontada como o produto mais desejado do mundo, segundo o ranking global da Lyst Index, superando marcas de luxo e consolidando-se como espécie de símbolo de desejo universal.
Como interpretar esse fenômeno?

  • Primeiro, há o poder da simplicidade: um produto acessível, quase banal-cotidiano (o chinelo) alcança status. O que sugere que, em mercados saturados de “novidade”, o simples pode tornar-se sofisticado.
  • Segundo, há o conforto e a “despretensão” como valores crescentes: em tempos de incerteza ou crise, pode haver um apelo ao familiar, ao relaxado, ao “menos é mais”.
  • Terceiro, há uma questão de identidade cultural: a Havaianas traz Brasil, praia, casualidade e uma série de elementos que geram narrativa e emoção, e não apenas funcionalidade. Isso conecta com os desejos de pertencimento, de autenticidade, de história.
  • Finalmente, há o dado estrutural: segundo o ranking, o modelo “Top Flip-Flops” registrou aumento de 34% nas buscas, em um universo que avaliou mais de 8 milhões de produtos.

O consumo não se resume mais ao luxo escancarado ou à ostentação máxima. Ele se desloca para produtos que oferecem história, conforto, simplicidade e autenticidade e que, no fim, geram desejo porque contam algo.

Tendências globais do consumidor segundo a WGSN

Para além de casos isolados, a WGSN identifica grandes vetores de comportamento que ajudam a explicar e antecipar como o consumidor pensa e age. Aqui vão alguns insights relevantes:

  • Segundo o relatório “What’s trending in consumer behaviour in 2024?”, surge o conceito de social learning, que são espaços onde os consumidores não só compram produtos, mas se envolvem em aprendizagem ou comunidade em torno deles.
  • O perfil “Forever Young Adult” da WGSN aponta que jovens (e adultos jovens) estão redefinindo marcos de vida, adiando “ser adulto”, investindo em nostalgia, em cultura pop, em comunidades.
  • Em “Consumers Will Be Choosing Quality Over Quantity in 2025” vemos uma tendência clara: em vez de acumular tendências rápidas ou “fast-fashion”, o consumidor opta por peças mais funcionais, de melhor qualidade, que duram.
  • Também há perfis como os “Reductionists” que buscam simplicidade, sustentabilidade, conexão humana, rejeitando o consumo massificado.

Dessas tendências, podemos extrair algumas implicações para marcas e conteúdos:

  • A autenticidade e a narrativa têm peso crescente: não basta produto, é preciso “porquê” e “quem somos”.
  • A experiência importa mais do que o mero objeto: comunidades, aprendizagens, sensações.
  • A durabilidade e o valor real substituem o brilho efêmero.
  • Há um movimento de retorno, ou de valorização, de algo que pareça mais humano ou tangível, o que nos leva ao próximo tema.

O retorno do impresso e do offline: mais do que nostalgia

Um contraponto interessante (e complementar) às tendências digitais dominantes é o ressurgimento de comportamentos ligados ao mundo físico, ao tangível, ao offline. Exemplos: jornais de papel, cartas manuscritas, materiais impressos, experiências analógicas.
Basta uma pesquisa no Pinterest para perceber a quantidade de inspirações para quem busca por livro-objeto (ou livro objeto), que é uma obra que ultrapassa a função tradicional do livro como suporte de texto e leitura linear. Ele é pensado como um objeto artístico em si, ou seja, o formato, os materiais, a estrutura e o design são parte essencial da mensagem e da experiência da obra.

Embora menos quantificados do que as tendências digitais, esse movimento pode ser lido como resposta ao excesso de digitalização, à saturação de telas, ao desejo de pausa, de toque, de intimidade.

Para ilustrar:

  • Vemos, em relatórios sobre design ou branding, que materiais impressos, sensoriais, táteis ganham nova atenção e o “tactile branding” emerge como diferencial.
  • Esse tipo de comportamento encaixa-se bem com perfis “Reductionist” ou “Time Keepers” (da WGSN) que valorizam rituais, conexão real e tempo de qualidade.
  • Em tempos em que o consumo digital é imediato e massificado, o impresso/offline aparece como “refúgio”, como experiência diferenciadora. E isso também pode gerar valor de marca.

Para marcas ou estúdios que produzem conteúdo, isso significa: pensar não apenas no digital puro, mas também na materialidade, no físico, no gatilho que o tato, o cheiro ou a presença física que algo gera no consumidor.

Ligando os fios: o que isso significa para quem produz (e para o Estúdio Letras)

Como estúdio ou marca que pensa em comunicação, design e conteúdo, há vários aprendizados práticos que derivam dessas reflexões:

  1. Conte histórias que conectem: O caso Havaianas mostra que o produto que carrega identidade, cultura e simplicidade se torna desejado. Na comunicação: priorizar o “porquê”, o “quem” e o “como”, além do “o quê”.
  2. Ofereça mais do que funcionalidade: Em vez de apenas vender produto ou serviço, crie experiências, comunidades, aprendizagens, momentos. Isso alinha com o “social learning” e com a busca por sentido.
  3. Valorize tangibilidade e presença física: Mesmo no digital, pensar no físico (material impresso, embalagem diferenciada, ambientes reais) pode gerar impacto. Um catálogo bem feito, uma carta personalizada, um evento analógico criam diferenciação.
  4. Observe perfis emergentes: Por exemplo, os “Forever Young Adults” ou “Reductionists”: pessoas que não querem mais ser bombardeadas por estímulos, que procuram conexão, significado, que valorizam o “menos” em tempos de excesso.
  5. Abra-se à contracorrente: Enquanto muitos falam apenas de digitalização e “sempre online”, há aqui uma oportunidade de ressaltar experiências off-line, materiais físicos, presença humana e tudo isso pode ser estratégico.

Comunicamos essência e de olho no comportamento do consumidor

O comportamento do consumidor hoje não é mais simplesmente “comprar o mais caro” ou “seguir a tendência mais rápida”. Ele combina desejo, comunidade, narrativa, simplicidade e presença: encontra na Havaianas, por exemplo, uma prova de que o simples pode tornar-se icônico. Ao mesmo tempo, aquele movimento de retorno ao impresso/offline mostra que, mesmo num mundo cada vez mais digital, há valor no tangível, no real, no palpável.

Para o Estúdio Letras, a convicção é clara: comunicar com profundidade, com materialidade, com sentido sempre. Porque na mudança dos comportamentos, há espaço para quem conversa com o humano, com o real, com o simples e faz disso valor.

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